Meu nome era Valentin Clinton.
Era.
Porque estou morto há dezoito anos.
Não
sei se você me perdoaria pelo que fiz, mas matei diversas pessoas. Não que eu
tivesse algo contra elas, apenas não confiei mais nelas. Eram tolas, falsas e
tinham a vida como um grande teatro ao céu aberto.
Odeio
pessoas que me enganam. Odiava ter que viver minha vida, que já não era lá
essas coisas, em meio as minhas próprias mentiras que me magoavam e tiravam
lascas de sangue, lágrimas e sensibilidade.
Eu
odiava ser sensível. Mas isso foi há muito tempo. Agora estou morto e nada mais
importa. A não ser o fato que você irá me odiar por isso.
Preciso
de mais um gole.
Queria
poder me imaginar como seria se ainda estivesse vivo. Se meu filho teria a
minha mesma aparência de quando eu era jovem, saudável e ainda suportava viver
nesse mundo. Queria ter dado mais atenção a ele, mas tive que abandoná-lo.
Deveria estar no inferno a essa hora, mas não estou. Porque enquanto estava
vivo vivia nele. Não sei onde estou. É tudo escuro e pútrido e apenas uma
lamentação me corrói.
Eu
tinha amigos. Era sempre assim, quando a bebida abria, eles apareciam.
Uma
dose: dez amigos.
Duas
doses: quinze amigos e uma namorada.
Mal
os conhecia, apenas faziam parte do meu circulo de amizades, mas quando
passavam por mim na rua, dias depois, fingiam que não me conheciam. Talvez
fosse culpa da bebida que havia reduzido o mágico milagre da multiplicação. Mas
não me importava. Companhia sempre foi algo descartável para mim. Mas houve uma
época que eram tantos. Houve uma época em que as aparências eram o que
importavam.
Dinheiro?
Okay.
Status?
Okay.
Bebida.
Fama. Um bom emprego. Uma pilha de revistas vogue sobre o entalho da cama. Uma caixa
de preservativo sabor morango. Ações que multiplicavam a cada semana. Uma
prateleira de livros intocados. Um bidê, de preferência cor rosa. Uma família
totalmente puritana e consumista. Confere. Confere. Confere. Confere.
Ainda
me pergunto se realmente fui louco. Se realmente foi preciso me colocarem naquele lugar. Sorte que hoje ele não
existe. Graças a mim.
O
grande problema em Haunted Hill é que ninguém era revistado. Se pudesse poderia
trazer qualquer coisa do lado de fora. Uma faca, uma bomba, veneno para
consumo. Mas eu não podia sair dali. Tudo que via durante meus dias eram
paredes brancas que giravam em minha mente e em meus pesadelos. Mas nada que um
sexo casual com algumas das enfermeiras não resolvesse o que eu mais queria. E
assim eu tinha um plano traçado.
Não
me julgue pelos meus atos. Acharia mais correto você me julgar pelo que penso
em relação aquilo que sempre enxerguei durante toda minha vida. Você pode dizer
que fui errado em ter tirado vidas inocentes, mas essas mesmas vidas faziam
parte do sistema e precisariam serem sacrificadas para mostrar a realidade em
que me encontrava. Não pretendo ser nenhum Hitler.
Se eu não jogo futebol perfeitamente me
chame de estranho.
Se eu não
aprecio a música clássica que está nas vitrolas, me chame de estranho.
Se minha roupa não
é suficiente a exata para mostrar meu lado sério ou descolado, me chame de
estranho.
Se
eu viro as costas para as picuinhas e conversas sobre sexo, farras e bebidas da
qual não faço parte, me chame de estranho.
Se
eu não sou daqueles que fala mal dos outros para conseguir entrar nas
rodinhas de conversas, me chame de estranho.
Se
eu não tenho o mesmo gosto sexual que a maioria, me chame de estranho.
Mas,
além disso, me chame de único, porque é isso que sempre procuro ser. Não são
roupas, músicas, rodas de conversas ou uma vida sexual ativa que irá me
definir. Não procuro ser exemplo para ninguém e muito menos para uma nação.
Tento trazer uma identidade única e com isso fazer com que deixe parte de um
legado a um mundo do qual pertenço.
Meu
mundo que mostra muito além de rótulos, características, papos desconexos.
O grande segredo é saber como destrinchar as fronteiras da minha mente
imaginária.
Calar a
boca está muito mais além que fechar os lábios. Está também no grande ato de
ignorar o mal que penetra em nossos ouvidos.
Eu
incendiei Haunted Hill. Eu vi o mesmo corpo que transei mais cedo ardes em
chamas e gritar não de prazer como antes, mas de horror em saber que a morte é
tão humana e falsa conosco. O álcool que tinha pedido mais cedo como desculpa
para um corte superficial foi o instrumento perfeito para a cena mais linda que
meus olhos poderiam enxergar. Minha obra prima posmortin.
Agora
sei que se possível você me mataria de novo. Mas ai é que está a graça. Eu já
estou morto. Eu precisava morrer para poder contar essa história. Antes de mim
algo foi contado. Agora chegou a minha vez de contar a verdade.
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